09 março 2008

Dia Internacional da Mulher. Viver é para profissionais!

Minha mãe, Noé tem 86 anos e mora em Quaraí. Fronteira com o Uruguay.
Falando, hoje, por telefone, ela me contou que às 15 horas escutou um barulho na porta e foi ver o que era. Era a Iara. Uma mulher chaveira. Da confiança de todos na cidade que tem cerca de 25 mil habitantes. (contando a zona rural).
- Oi Iara (disse ela com cara de interrogação) enquanto a chaveira colocava pó de grafite no miolo da porta.
A Iara rapidamente percebeu a cara de surpresa da minha mãe e como sabe tratar com pessoas de...digamos...certa idade, saiu justificando porque estava ali.
- Oi Dona Noé. A senhora me ligou ao meio-dia pedindo para vir arrumar a fechadura da porta. Como prometi, estou aqui às 3 horas.
A mãe, macaca velha (el diablo sabe más por viejo do que por diablo - José Hernadez) concordou e pagou os 10 reais pela visita.
Depois da saída da Iara, entrou em parafuso.
-Estou esclerosada! Perdi a memória!
Ou seja, achou que finalmente tinha envelhecido. No mau sentido!
Logo ela que dirige um Clio 1.6 e recusou um Clio 1.0 porque achava que o carro não “puxava” quando necessário. Ela que tirou a carteira de habilitação com 60 anos e recusou a nota 9,5 e fez um novo exame para ter o 10 que “sabia” que merecia...que coisa!!!
Perguntou para a “secretária”:- onde eu estava hoje ao meio-dia??????
-Dona Noé, a senhora tinha ido(de auto, é claro) a Artigas (cidade uruguaya que faz fronteira com Quaraí)
Aí a mãe concluiu que não havia feito aquele telefonema chamando a chaveira.
Bem, a partir daí as especulações abarcam um universo infinito.
Golpe da chave. Conflito, pois a moça chaveira é de confiança da cidade e de família. A “secretária” estaria mentindo??? Sei lá...para uma...senhora...de 86 anos...todos podem estar conspirando contra...ou é tudo coisa da minha, digamos, caduquice?

À noite o pianista Miguel Proença faria um concerto em Quaraí, sua terra natal. A minha mãe, motorizada, ficou de passar na casa da amiga Lelinha, mãe do lendário jornalista/músico/parceiro de bar/amigo, fora o resto, José Antonio Ribeiro (Gaguinho).
Quando chegou, a amiga pediu para que ela passasse na casa da dona Zoé, outra viúva, dessas que ficam melhores depois que os filhos crescem.
A mãe ficou feliz, pois fazia muito tempo que não via a dona (o dona é meu por educação. Fui aluno dela) Zoé.
Bem, o programa foi só alegria. O concerto maravilhoso. O Miguel é muito gentil (vi ele crescer, diz a mãe).
Mesmo feliz com o encontro da Zoé e com o concerto do Miguel a mãe não conseguia tirar da cabeça o fato de que...havia envelhecido. Sem memória. Passando vergonha...QUE ...!!!!
Mas tudo bem. Quando foi deixar a dona Zoé em casa ouviu a seguinte reclamação:
- Que problema Noé! Vou ter que entrar pela porta dos fundos pois liguei para a Iara, hoje ao meio-dia, e ela prometeu que estaria aqui às 3 da tarde para arrumar a fechadura da porta da frente que não está funcionando e não veio.
Noé/Zoé...Bem, segundo relato da minha mãe, ela ficou bem quieta, rindo por dentro, é claro, e continuou se sentindo jovem.
Tenho 54 anos e sempre penso...no futuro. Não sei se seria negócio, pra mim, chegar aos 85 depois de tudo que fiz. Mas chegar aos 85 com esse espírito auto-crítico de resistência ao inexorável é muito mais do que eu jamais havia imaginado.
Espero ser herdeiro deste grande patrimônio genético, como dizia o meu amigo Sérgio Bonson.
(Escrito em 11 de abril de 2006 na comunidade da mãe no orkut que se chama A Vó Noé não é mole. As idades estão atualizada e a mãe continua dirigindo o Clio)

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