(para Carlos Bastos e Leônidas Nora)
Para quem chega pela ponte metálica “Dr. Diniz Assis Henning” vindo de Mafra (SC) encontra primeiro o bar do “Orli” e depois o “Café Avenida”, no lado direito da Rua 15 de Novembro, já em Rio Negro (PR). Após a Guerra do Contestado (1912-1916) os limites ficaram definidos. Saindo da ponte, você pode curtir aquela rua estreita e tomar uma cerveja ali no “Orli”, na quadra seguinte depois da Praça “Sargento Max Wolff Filho”. Orli Alves Coelho o proprietário, inaugurou o bar no final da década de 1950 e administra o estabelecimento com algumas peculiaridades que já fizeram a alegria dos estudantes da escola Lysímaco Ferreira da Costa, por exemplo, quando emprestava gravatas, roupas, “pindurava” a comida e até oferecia pousada para os mais descuidados. Isso quando não levava até sete estudantes no seu carro, em viagem única de carona, à escola agro-técnica, cerca de 12 quilômetros dali. Aos 81 anos, Orli ri quando se lembra daqueles tempos. A única coisa que mudou no ambiente foi o balcão, saindo do lado esquerdo e indo para a direita, onde ficou melhor, aliás, penso, como quase todos os meus conhecidos que militavam na esquerda... O chão de ladrilhos hidráulicos, ilustrados por pequenos cubos; o banheiro ladeia o corredor, pequeno, com a mesma cara desleixada de alguns freqüentadores que parecem ser os mesmos sempre, mas dando conta do recado e na extremidade, depois de um lance de escada em desnível, atrás de uma porta envidraçada, quatro mesas de snooker, testemunhas únicas daquela voragem do tempo que engole as pessoas mantendo os objetos que as viram pela última vez. Magro, alto, bem humorado, aparentando ter 20 a menos, com um fez de tricô na cabeça, semelhante a um árabe de férias, Orli continua fazendo tudo sozinho ali no bar. O ex-caminhoneiro, de Bom Retiro, inventou uma bebida em embalagens de dois litros, um kit que faz a alegria da população de baixa-renda e mantém o lugar animado nos finais de semana. A cerveja continua sendo chamada de “faixa-azul”, e a quem interessar a velha rivalidade entre o Peri-Ferroviário e o Operário, é a mesma. O Helton Sfair um cliente que acompanha a nossa conversa, afirma que às vezes tem de tomar conta do lugar porque o Orli sai. Confiança rara em se tratando de um bar, mas ninguém ali pensaria em tirar proveito de tal circunstância.
O Orli nunca casou, diz que “burro velho não se deixa amansar na carreta”. Leva tudo na graça, para bom entendedor basta a filosofia “lugar de porco é no chiqueiro, do cachorro na corrente e das visitas, na sala”, misturar isso já dá confusão. Quando estava juntando umas latinhas de cerveja, elogiei sua dedicação com o lixo, afirmou que guardava aquele vasilhame para uma “velhinha” que vinha buscar todos os dias... Rimos, afinal, na hora os 81 anos tinham o seu charme.
Vejo umas fotos antigas, reconheço meu professor de desenho, Lídio Redin e também o de português, Nivaldo Lang, ambos tinham sido mestres do meu pai, no Barão de Antonina, em Mafra... Vida curiosa, o último tinha me posto nas mãos o “Chapadão do Bugre” e “Vila dos Confins”, de Mário Palmério, livros emblemáticos que me deram a certeza de que a literatura era o caminho.
Alguém pediu uma cerveja na ponta do balcão, Orli respondeu “agora não posso, não vê que estou conversando”... Era assim, com aquele humor que justificava a sua longevidade.
Não precisei muito para provocá-lo, afinal 37 anos depois eu continuava sendo um dos seus clientes, ex-aluno da Escola Agrícola, minha surpresa fica por conta daquelas recordações, da memória viva, como se estivéssemos nos despedido ontem e os outros estivessem atrasados para aquele encontro!
Hei, Sérgio Rubim, salve!
ResponderExcluirNão sei onde foi "desencantar" aquela foto da ponte "Dr. Diniz Assis Henning" que liga Mafra (SC) a Rio Negro (PR) mas ficou duca...
Grato pela acolhida e por manter o senso editorial na ativa...
Abração do viking, na Lagoa da Conceição, prestes a abrir os trabalhos do dia... Ah, ah, ah!