28 dezembro 2008

O QUE ME CHAMOU A ATENÇÃO

Por Olsen Jr.

Enquanto o café não vem, espio a Folha de São Paulo. Na década de 1970 era o nosso jornal diário favorito porque dizia de maneira clara o que nós, os rebeldes, gostaríamos de dizer (e que a censura deixava passar); depois vinha o Pasquim pelo deboche e humor, a crítica cáustica (a censora foi cooptada e bebia junto); tinha o Opinião, com textos traduzidos do Le Monde, culturalmente, o melhor do País dirigido pelo Fernando Gasparian, também na editora Paz e Terra com Fernando Henrique Cardoso e Celso Furtado em seu conselho editorial...

Teve aquele período intermediário em que os jornais começaram a substituir as matérias censuradas por versos dos Lusíadas, de Camões e receitas culinárias, por exemplo, mas o Opinião deixava o texto censurado sem um “plano B”, ficavam então imensos “clarões” distribuídos ao longo das páginas, até quando a eloqüência desses espaços em branco falou mais alto, fechou as portas.

De repente era pelo Paulo Francis, ainda na Folha, gostava do seu cinismo, da cultura, dos referentes, e principalmente porque não deixava pedra sobre pedra, independente do assunto, se literário, culinário, musical, cinematográfico, filosófico, sociológico ou político. Depois ele foi para o Estado de São Paulo, fomos juntos.

Coincidiu com a saída do Francis, o nosso cansaço da crítica gratuita. Damo-nos conta, subitamente, que não havia (para os comentaristas da Folha) um filme que prestasse, uma peça de teatro que valesse a pena, um livro sequer de autor nacional recomendável... Os iconoclastas quebravam tudo e não punham nada no lugar, aconteceu o mesmo com o Pasquim, num dia qualquer, amanhecemos cansados daquela gratuidade, e partimos para outra. Sem contar que comentando sobre esportes, no futebol por exemplo, é uma máfia, um grupelho fanático que indistingue razão de paixão, fatos com ficção, mas é outro papo.

Bebericando o café e “bispando” a Folha (07/12) leio sobre os 40 anos do AI-5, a bela Maria Tereza Goulart batendo uma foto do marido, ex-presidente João Goulart, ainda exilado no Uruguai, uma fotografia conhecida, mas instigante...

Até chegar a uma nota em duas colunas, no canto direito, embaixo, na edição de domingo, era um obituário, só me dei conta no final...

Falava de um cidadão que trabalhara durante 20 anos no Tribunal de Justiça de São Paulo, possuía um Fiat 147 na garagem, mas usava o ônibus para ir para o trabalho. Tinha medo que o seu carro não agüentasse o tranco. Morrera de complicações com o colesterol e o diabetes.

Curioso foram os depoimentos dos amigos, diziam que ele amava os Beatles e os Rolling Stones, mas também apreciava música clássica e jazz.

Falava de um episódio de sua infância em que fora levado pelo pai para assistir a um comício no ABC paulista, de um metalúrgico de codinome Lula e que despontava como líder sindicalista e por conta do episódio começou a ler Marx, Engels, Lênin e a se interessar sobre o socialismo, gostava mesmo de filosofia.

Interessante como tudo se repete, tirando o Lula e substituindo por Jânio Quadros que o meu pai me levou para assistir na Avenida Getúlio Vargas em Chapecó, o cara poderia ser eu... Mas no final, alguém afirmou que ele era muito engraçado depois das 17 horas, mas por razões opostas ao riso, é que suas piadas não tinham a menor graça, e por isso despertavam a hilaridade dos outros. Ah! Ele estava noivo e iria casar no próximo ano.

Estou fora! Isso ficaria mais verossímil na boca de um amigo, comentando o poetinha morto, diria: “ele era um solitário, sartriano, jamais suportaria a idéia de duas liberdades se fazendo horrores pela eternidade afora, preferia, isso sim, carregar a maldição de ser um poeta só e não servir de exemplo para ninguém. E isso não tem a menor graça em tempo algum, a não ser, talvez, para a musa que lhe serviu de inspiração e o condenou àquela liberdade!”.

(Publicado originalmente no Jornal “A Notícia”, em 26/12/08).

Um comentário:

  1. Alô, Sérgio, Salve!

    Já disse e repito (pela última vez)
    não sei onde você se inspira nas ilustrações, mas bah, tchê! Está duca, como diria o próprio Paulo Francis, se vivo estivesse!

    Abração e continuamos vergastando a "canaille", como diria o PF...

    Abração do poeta... Olsen Jr.

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