09 janeiro 2009

ÍNDIO VELHO

para Tabajara Ruas, Nei Duclós, Janer Cristaldo, Arthur Monteiro e Jakzam Kaiser

Por Olsen Jr.

Comecei esta conversa e preciso terminá-la. Depois de comentar a forma grosseira com que a filha do estancieiro o impediu de tomar um trago comigo no balcão; mais tarde, também, um suposto imaginário (dela) do por quê da ação já publicado aqui, restou então o gaudério fazer a sua confissão, que julgo necessária, afinal, somente agora, teremos todas as versões da história:

“Nasci em 1925, tinha menos de dez anos quando ouvia na Rádio Farroupilha de Porto Alegre, um grupo chamado “Quarteto dos Tauras”, curiosamente liderado por um cantor e músico catarinense, Pedro Raymundo, nascido em Imaruí e um acordeonista de primeira. Interessante é que sempre me lembro disso quando venho à Santa Catarina. Foi o primeiro artista gaúcho a fazer sucesso no Brasil. Revelando aquele tradicionalismo que se leva para onde se vai, e que ser gaúcho é mesmo um estado de espírito (uma vez que ele era catarinense), mas se apresentava pilchado, de botas, esporas, bombacha, guaiaca, lenço, chapéu e pala. Sua importância era tamanha que até o Luis Gonzaga, o “Rei do Baião”, influenciado pelo sucesso de Pedro Raymundo passou a se vestir como um sertanejo nordestino em suas apresentações.

“Antes de chegar aqui neste bar eu estava assobiando a canção “Adeus, Mariana”...

“Meu pai também gostava muito de música. Acho que está no sangue, este amor missioneiro pela poesia, a rima, a payada em si e que se distingue da milonga por ser mais popular. Um pajador vale muito. Basta tomar um trago e já me ponho a ter saudades da querência, do Martin Fierro, do meu amigo Jayme Caetano Braun... Em que lugar será que ele anda, com o patrão velho lá na última invernada? Como dizia o meu pai quando se referia a Deus e ao Paraíso ou o lugar onde estaremos um dia...

“Mas aqui, nem posso compartilhar desses arroubos, sequer me deixam se aproximar de um copo, me sinto pior que o “Tio Anastácio” do poema do Jayme aquele personagem que nos bolichos só se alegrava bebendo... De quando em vez encontro um parceiro para um dedo de prosa, mas só por acidente, como agora, com esse colorado como eu aqui no balcão. Não me meto em política, mas para todos os efeitos, sou maragato, se estivesse no Alegrete estaria com um lenço vermelho no pescoço...

“Peço um vinho que é a minha bebida favorita, não importa a marca nesse caso, porque tenho de beber rapidamente, quase sem ser percebido, só que entre um copo de água e um de vinho prefiro este último.

“Um vivente com a minha idade, 83 anos, precisa de pouco para ser feliz. Um trago, boa charla e amigos para compartilhar a memória e a família ao redor, na querência ou no pampa, um missioneiro que se preza não enjeita circunstância quando está bem acompanhado. Do que um homem precisa mais?

“Olhando daqui da janela, não mal comparando como dizem lá no Alegrete, mas essa Lagoa aí em frente bem que me lembrou o Rio Ibirapuitã, é porque levamos essas imagens junto, tendemos a reproduzi-las quando dá, como agora por exemplo.

“Pra quem chega de Rosário ao fim da tarde/ ou quem vem de Uruguaiana de manhã,/ sentir o sol como uma brasa que ainda arde/ mergulhado no rio Ibirapuitã... Do poema Canto Alegretense, gosto de cantar quando bebo...

“Bueno, preciso me despedir, já me chamaram, não da maneira que gosto, mas é a vida agora cercada de uma vigilância de que não preciso, mas gaúcho que é gaúcho também não enjeita um afago e nem está livre de um abraço amigo, e só resta dizer: até mais colorado e vamos em frente... Saio em tempo de ouvir do companheiro no balcão, um “até!”que me pareceu uma sugestão para outro trago, quem sabe em outra invernada, no futuro!”.

Um comentário:

  1. Sérgio, salve!

    Bonito... Bonito mesmo, o Pedro Raymundo ainda está para receber uma grande matéria na imprensa... Se ninguem fizer, acabo fazendo, há que se ter a vivência, senão não dá...

    Lembro da entrevista que o "Rei do Baião", o Gonzagão, deu para o "Pasquim" em que declinava sua grande admiração pelo instrumentista catarinense, dizendo que foi em função dele que passou a se vestir como sertanejo nordestino em suas apresentações...

    Assunto para outro dia...

    Abração do viking!

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