"Do ponto de vista didático, o indivíduo que bebe compulsivamente ou que tem no ato de beber uma atividade inerente a sua própria vida, praticando-a mesmo em todas as oportunidades possíveis, é um alcoólatra. O sufixo “latria” quer dizer “adoração”, e portanto, o seu praticante é um adorador do hábito, executa-o com devoção.
Pode-se arrolar uma vasta sinonímia para o portador do vício de beber, juntando o popular, a gíria e até o erudito: bêbado, bebum, biritum, pé de cana, pudim de cana, pau d´àgua, alcoólatra, alcoolista e até dipsomaníaco.
Criaram-se eufemismos para se dourar a pílula, para que os familiares de um interno da instituição dos AA (Alcoólicos Anônimos) possam explicar para o entourage que um dos seus entes queridos está sob tratamento científico e sob controle.
Empregar o termo “alcoólico” para um doente é no mínimo estranho. O adjetivo cabe mais para consolidar o teor de álcool contido em uma bebida. Uso amplamente disseminado e aceito por todas as grandes marcas de fabricantes de bebidas, explicação exigida por lei e inscrita nos rótulos: “tantos % de teor alcoólico”, por exemplo.
Igualmente, usar a expressão “alcoólatra” para designar (abusando do sufixo latria) um colecionador de bebida é ridículo, para dizer pouco. Um colecionador é alguém com poder aquisitivo, de bom gosto, estudioso de tudo que envolva a sua coleção, seja ela qual for: charutos, vinhos, uísque... Mas para se dedicar na condição de profissional ou de diletante, é preciso um “gosto” que é anterior a ação de colecionar.
Portanto, no caso da bebida, é óbvio que o dono das garrafas também é um bebedor, moderado, certamente, mas usuário. Bebe menos e com qualidade. Os ingleses e franceses tem um termo mais adequado e elegante para esses privilegiados, “expert” ou “conneseur”, o que é mais elegante do que “alcoólatra”, tenham dó.
Cientificamente está provado que o álcool é uma droga e que o alcoolismo é doença e, portanto tem tratamento. Igualmente, que um artista, seja ele pintor, músico, escritor ou praticante de qualquer arte conhecida, não melhora seu desempenho ingerindo drogas, e o álcool é apenas uma delas.
Falando da literatura que é a minha área, todos os grandes escritores (que eram alcoólatras) não bebiam enquanto estavam escrevendo. Permaneciam eventualmente em grandes períodos de estagnação intelectual, de esterilidade criativa, em função da euforia e posterior depressão do excesso de bebidas, mas não misturavam ambas as coisas: ou se bebia ou se escrevia não necessariamente nessa ordem e nem simultaneamente. Quem não entendeu isso não fez literatura, como explicou Truman Capote, a respeito de Jack Kerouac, mas sim datilografia.
Separar a arte de escrever da ocupação etílica requer um esforço hercúleo, que o digam Jack London (que chegou a produzirr um grande livro sobre esse conflito “John Barleycorn” (João Pé-de-Cana) – memórias alcoólicas aliás, foi ele quem antecipou a “Lei-Seca” nos Estados Unidos em mais de dois anos; Scott Fitzgerald, Ernest Hemingway, William Faulkner, John Fante, Charles Bukovsky, William Burroughs, Edgar Allan Poe, O. Henry, Dorothy Parker, Edmund Wilson, entre outros..."
Espero estar colaborando para esse monólogo, ah, ah, ah!
Abração do viking
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